Impotência Masculina.
- Dan Mena Psicanálise
- 27 de set. de 2023
- 19 min de leitura
Atualizado: 22 de set. de 2024
“A impotência masculina é um sintoma complexo, onde o homem teme perder sua masculinidade, interferindo na sua capacidade de funcionar sexualmente.” Dan Mena. Por Dan Mena.

Com os avanços da medicina, pesquisa e desenvolvimento da química farmacêutica deste século, não seria um impossível que tivéssemos chegado a algum comprimido milagroso que pudesse ser chamado de pílula da felicidade. No entanto, no campo sexual, remédios como Cialis e Viagra não deram conta de suprir integralmente a deficiência daqueles que acudem ao seu uso para dar frente a problemas de impotência, sem mencionar ainda, seus perigosos efeitos colaterais. Para remontar há um pouco da história, a primeira notícia escrita que trata do conteúdo foi encontrada num papiro de 2000 a.C. Foi neste documento transcrito que se fala de dois tipos de impotência, a natural, em que o homem era incapaz de completar o ato sexual, e a sobrenatural, que era a ação ligada aos deuses, aos quais se lhe atribuíam os poderes de potência. Neste sentido, Hipócrates discursa sobre o tema, citando casos de pacientes moradores de cidades abastadas e personalidades tão ricos quanto, é concluiu, que dita causa estava relacionada com a equitação, dado o cavalo ser o meio de transporte tradicional naquele momento. Faz então uma anotação interessante, observando que esse fator de risco, ao qual a plebe não estava exposta, visto que ter equinos era considerado uma posse importante, assim, os mais pobres, aparentemente não sofriam de tal queixa pela ausência de tal patrimônio. Ele deduz que, como os nervos do pênis precisavam de energia e do espírito para ficarem eretos, a ereção acontecia pela insuflação de ar, teoria mantida até Da Vinci verificar em 1505, que uma acumulação de sangue acontecia no pênis ereto, mudando a teoria anterior pela sua comprovação. Passado o tempo, tais reparos passaram despercebidos até ao início do século XX. Atualmente, falamos de impotência ao tratar de uma situação continuada, um episódio isolado não é considerado um sintoma qualificador. A persistência e frequência da queixa é o início de uma sinalização para os homens, que precisam procurar ajuda para o problema em algum momento. Infelizmente, e, a pesar de afetar mais de 55% da população masculina, a maioria resiste ao enfrentamento, não admitindo seu problema de virilidade e renegando se consultarem com um médico ou especialista para tratar o inconveniente. Por sua vez, hoje temos dados muito precisos quanto ao funcionamento sexual, a ereção envolve a vasculatura e o sistema nervoso simpático, que controla a reatividade vascular. Freud entra nessa análise, confrontando a definição dos afetos, e incluindo o fator emocional que pode estar incluso, elemento ao qual a psiquiatria e os fármacos estão agora ponderando, englobando o ataque de pânico e a impotência masculina. Em 1912 Freud disserta “Sobre a degradação generalizada da vida amorosa”, e introduz o seu desdobramento em termos de impotência psíquica, fazendo a seguinte alusão: “Se o praticante de psicanálise se perguntar qual é a condição para a qual lhe é mais frequentemente pedida ajuda, deve responder que, para além da ansiedade nas suas muitas formas, é a impotência psíquica”. Assim, deixa muito clara a admissão desse marco psíquico para a matéria, acrescentando não haver indivíduo que não tenha passado por um período de anorgasmia. Boa leitura.
“A impotência psíquica, se refere à incapacidade de um indivíduo em enfrentar e resolver conflitos internos, levando a uma sensação de paralisia emocional e mental em sua vida.” Dan Mena.
A degradação da vida amorosa: Complexo de Édipo:
O Complexo de Édipo é a formação de relações amorosas durante a infância, que desenvolvem sentimentos de amor e desejo pelo genitor do sexo oposto, são emoções ambivalentes em relação ao genitor. Esses embates, podem deixar uma marca duradoura nas relações amorosas adultas.
“O Complexo de Édipo é o núcleo de toda neurose, e o destino do indivíduo está selado para sempre quando se torna irreversível.”
A degradação da vida amorosa pode ocorrer quando as resoluções do Édipo são inadequadas ou quando os sentimentos ambivalentes não são devidamente processados. Por exemplo, sentimentos de rivalidade com o genitor do mesmo sexo não resolvidos, podem levar a problemas de intimidade.
Recalque e fantasias sexuais:
Os desejos sexuais nem sempre são expressos abertamente e podem ser submetidos ao recalque, empurrados para o inconsciente, reprimidos, influenciam negativamente a vida sexual na maturidade. “As fantasias sexuais são tão intimamente entrelaçadas com nossos sentimentos emocionais que é difícil, se não impossível, fazer distinções rígidas entre elas.”. Não conseguir reconhecer ou lidar com ditas lascívias sexuais provoca o descontentamento nas relações.
Pulsões de vida e de morte:
Pulsões de vida (Eros) e de morte (Tânatos) como forças motivadoras na psique, estão associadas a potências que promovem a vida, incluindo o amor e o desejo sexual, enquanto Tânatos representa forças destrutivas e autodestrutivas. “A psicanálise considera o amor como uma das forças da natureza que utiliza todos os meios ao seu alcance para fazer progredir seu trabalho. O homem se esforça para preservar sua própria vida e prosperidade; seu amor é uma expressão deste esforço.” A degradação ocorre quando as pulsões de Tânatos, como a autossabotagem emocional, influenciam negativamente os laços. Isso pode resultar em padrões destrutivos de comportamento ou na escolha de parceiros impróprios.
Transferência e Contratransferência:
A transferência se refere a sentimentos e emoções de um indivíduo para outro, geralmente o terapeuta. A contratransferência é a resposta emocional do terapeuta à transferência do paciente. Esses conceitos podem ser aplicados às relações amorosas, onde as experiências passadas moldam como as pessoas se relacionam e como interpretam o comportamento de seus parceiros. “A transferência é o instrumento pelo qual o paciente busca e obtém a satisfação de seus desejos inconscientes.” Quando as transferências não são reconhecidas ou exploradas de maneira saudável, por exemplo; se um indivíduo transfere sentimentos de uma figura parental para um parceiro amoroso sem consciência disso, isso pode levar a crises de relacionamento.
A impotência psíquica.
Não podemos falar do tema sem também abordar a ''impotência psíquica'' como sinalizei na introdução, que, na perspectiva da psicanálise, afeta o fisiológico, porque é desencadeada por um gatilho emocional. A sua compreensão deve necessariamente incluir as teorias do inconsciente, do complexo de Édipo e da sexualidade. Além disso, constatemos as suas implicações clínicas. Este sentimento de insuficiência ou inadequação surge sob múltiplas manifestações e possíveis causas, como resultado de conflitos entre desejos conscientes e conteúdos reprimidos. Um indivíduo pode se sentir impotente em situações sociais devido a ansiedades relacionadas com a infância ou com acontecimentos traumáticos, que foram contidos e refreados. Através do Complexo de Édipo, vemos, que crianças desenvolvem desejos inconscientes em relação aos seus pais, que podem ser acompanhados por sentimentos de culpa, inadequação emocional e impotência, resultantes em desajustes quando não são adequadamente resolvidos. Podemos experimentar impotência nas relações íntimas devido a uma ligação intensa a um dos pais durante nossa infância, incluindo os tabus. Esta ligação pode produzir uma competição em relação ao parceiro, dando origem ao sintoma.
Como isto se traduz na prática clínica?
Uma resposta reside nos mecanismos de defesa, estratégias psicológicas utilizadas pelo ego para se proteger do conflito. Estes dispositivos recorrem à negação, ignorando psiquicamente a existência do problema, recorrendo à medicação química ou à minimização para evitar este choque enraizado. Neste sentido, damos grande importância à infância do sujeito, investigando um período crítico no seu desenvolvimento psicológico. Os traumas ou experiências negativas podem ter tido um impacto duradouro, como o abuso ou a negligência, levando a sentimentos de impotência que persistem na idade adulta. Por conseguinte, é importante abordar, identificar e trabalhar estas memórias reprimidas e os sentimentos a elas associados para apoiar a sua recuperação equilibrada. A impotência não existe isoladamente e está muitas vezes interligada com outras perturbações, como a depressão, a ansiedade e, sobretudo, as inquietações da personalidade. O caminho para desarmar a impotência deve, portanto, ser orientado pelas necessidades individuais do paciente e por um conhecimento profundo da sua história e das suas experiências de vida.
Diferenças entre a impotência psicogênica e a impotência orgânica.
A diferença entre a impotência psicogênica e a orgânica é que nela a ereção noturna ou matinal é preservada independentemente da antecipação da relação sexual. Também é típico que não ocorra com todos os objetos sexuais; um homem é impotente com uma mulher e não com outra, não tem impotência orgânica. A psicogênica, também conhecida como disfunção erétil, se refere à inépcia recorrente ou persistente de um homem para conseguir ou manter uma ereção suficientemente firme para a concretude da relação sexual, devido a fatores psicológicos e não a causas físicas. Ao contrário da disfunção erétil de origem física, que pode estar relacionada com problemas médicos, como doenças cardiovasculares, diabete, problemas hormonais ou lesões neurológicas.
As causas da impotência psicogênica podem incluir:
Ansiedade: O stress, a ansiedade de desempenho ou a preocupação com o desempenho sexual podem interferir com a capacidade de um homem manter uma ereção.
Depressão: Pode afetar negativamente a função erétil, reduzindo o interesse pelo sexo e diminuindo a excitação sexual.
Trauma sexual: Experiências sexuais traumáticas ou abuso no passado podem levar a problemas de impotência psicogênica.
Problemas de relacionamento: Conflitos ou tensões no relacionamento podem contribuir para a disfunção erétil psicogênica.
Culpa ou vergonha: Os sentimentos de culpa ou vergonha relacionados com o sexo, ou a sexualidade podem afetar negativamente a função erétil.
Impotência orgânica — Algumas das causas mais comuns de impotência orgânica são:
Doença cardiovascular: Problemas como a hipertensão, a arteriosclerose (endurecimento das artérias) e a doença cardíaca podem impedir o fluxo sanguíneo para o pênis, afetando a ereção.
Diabete: Pode danificar os nervos e os vasos sanguíneos, o que pode causar problemas de ereção.
Distúrbios hormonais: Desequilíbrios desta ordem, como a insuficiência de testosterona.
Problemas neurológicos: A lesão da medula espinal, a esclerose múltipla e outras condições neurológicas podem interferir.
Efeitos secundários de medicamentos: Antidepressivos, antipsicóticos e anti-hipertensivos, podem ter efeitos secundários.
Cirurgia ou lesão pélvica: Uma lesão ou cirurgia na pélvis, ou na zona genital pode danificar os nervos, ou os vasos sanguíneos necessários para a ereção.
Causas psicanalíticas da impotência masculina:
Conflito intrapsíquico: Os conflitos interiores não resolvidos podem manifestar-se sob a forma de impotência. Por exemplo, os sentimentos de culpa ou de ansiedade relacionados com a sexualidade podem bloquear a função erétil.
Abordagens terapêuticas pontuais da psicanálise.
No seu texto “Inibição, Sintoma e Angústia”, de 1925, Freud descreve como a função sexual sofre perturbações muito diversas, que se resumem na impotência psíquica. A fixação infantil intensa, a barreira do incesto e a frustração nos anos de desenvolvimento seguintes à puberdade, que estão presentes na grande maioria dos homens, justificariam a expectativa de que seja uma aflição universal da cultura, e não a doença determinante de alguns sujeitos. Longe do que se poderia pensar, a liberação dos costumes sexuais também não serviriam para modificar sua presença, o que denota que a libertação dos costumes não significa necessariamente a libertação do desejo. Destarte, às relações sexuais são apenas uma das múltiplas formas de expressão na vida do indivíduo, o objetivo original da nossa pulsão sexual não é a procriação, mas sim, a obtenção de prazer. Desta forma, podemos concluir que o dito comportamento sexual de uma pessoa é, portanto, o protótipo de todas as suas outras reações. A função sexual, que outrora é afetada por diversas tensões e desconfortos, onde a maioria das quais são apenas simples inibições, como a incapacidade de escrever ou de falar em público, bem como nas relações sexuais, a incapacidade de amar e se entregar ao ato desinibidamente. Entrando no domínio fisiológico dos órgãos genitais, a disfunção erétil pode ser diagnosticada em todos os homens que não têm uma ereção suficientemente rígida para permitir a penetração, bem como naqueles que a perdem após uma mudança de posição ou pouco depois da penetração.
Os principais sintomas de inibição na área da resposta sexual nos homens.
Desprazer psíquico (desejo sexual hipoativo)
Falta de ereção (disfunção erétil)
Ejaculação precoce
Falta de ejaculação (perturbações do orgasmo)
Ausência de sensação de prazer durante o orgasmo.
O outro ângulo.
No entanto, se seguirmos a Lacan, alguns determinantes vão tomar outra direção, onde a operação analítica vai contra a lógica do ''Um'' que impõe a “ereção” como condição. E essa lógica produz a impotência. A eficácia da análise deriva da desabituação da forma parasitária dessa gravidez fálica, a “dominância imaginária do atributo fálico”. Por isso, nem tudo é gozo fálico e, seja o que for, é importante que a predominância imaginária não opere como condição mutilante do gozo que aí é possível. Nesta condição, como psicanalistas, somos absolutamente contrários à urgência. Quando o Viagra chegou ao mercado, muitos pensaram ser a panaceia para a impotência masculina. No entanto, apesar da sua utilização generalizada e após mais de 20 anos, a impotência continua a ser um dos sintomas mais frequentes na clínica. Quando falamos de impotência, não devemos pensar apenas numa ereção ou num pênis flácido, mas em várias situações em que o sujeito, seja na posição masculina ou feminina, não obtém o sucesso esperado. Assim, a impotência tem um valor subjetivo muito importante, pois o desejo só é reconhecido pelos seus reveses. Digamos, olhando por uma janela metafórica lateral da coisa, há, sim, um certo idealismo que se defende que, se o objetivo não é atingido, é porque não se estava verdadeiramente motivado. Na impotência e a impossibilidade na visão psicanalítica da escola lacaniana, há uma diferença fundamental entre esses dois fatores. A impotência não seria outra coisa senão o ''inverso'' de uma vontade de poder, o pesadelo que retorna para àquele que inflou seu ser, é seu ter, até o ponto de estourar o balão. Portanto, o lamento do impotente seria a queixa imprópria e enganosa daquele que, querendo tudo, sufocou o seu próprio desejo. Se quisermos inverter esta situação, ou seja, despertar o seu desejo, o mais adequado é desmascarar essa vontade de realização que o impotente camufla e esconde de si próprio e dos outros. A pessoa afetada pela impotência precisa de uma boa dose, ou melhor, de múltiplas pequenas doses de impossibilidade, daquilo a que chamamos castração, a lei que faz descer os mortais à terra, para renunciarem a uma parte desse gozo que os prende, que os incapacita, mental e fisicamente. Quem não renuncia a algo, não aposta no fato de que na vida também se lançam os dados. Por essa razão, assumir a impraticabilidade e inexequibilidade do impedimento, é a nossa condição de sinônimo de recuperar o desejo, com o efeito mobilizador de nos lançar na procura.
Na sua análise da sexualidade e da impotência sexual, Lacan se centrou em questões psicológicas e simbólicas, e a sua abordagem olha fortemente em conceitos-chave da sua teoria geral, como a linguagem, o desejo e o complexo de castração;
Desejo e castração: A sexualidade está intrinsecamente ligada ao desejo e à castração simbólica. O complexo de castração se refere à consciência da criança de que não pode ter a mãe só para si, uma vez que o pai existe como figura de autoridade e posse simbólica da mãe. Esta compreensão é base para o desenvolvimento psicológico e sexual do indivíduo.
Falta e desejo: O desejo é marcado por uma falta fundamental. Esta ausência é vivida numa busca constante de algo que ''não está'' e que nunca pode ser totalmente satisfeito. No contexto da impotência sexual masculina, isso pode ser interpretado como uma luta para manter uma ereção ou para satisfazer plenamente uma parceira, o que se torna um desejo inatingível e impossível de sustentar.
Falo e castração: O conceito de “falo” como símbolo de poder e realização. A castração simbólica implica a perda desta concretude e, na idade adulta, a impotência pode ser vista como uma manifestação desta, uma vez que o homem se sente privado da sua capacidade de satisfazer plenamente sua companheira.
Função fálica: Como uma forma de simbolizar a autoridade e o poder associados à masculinidade na cultura. A impotência sexual pode ser interpretada como uma ameaça a esta função fálica e a uma consequente perda de autoridade simbólica para o homem.
Se fizermos um resumo, segundo Lacan, a impotência sexual pode ser interpretada como uma manifestação da luta do homem para satisfazer um desejo inatingível e para manter a sua autoridade simbólica no domínio da sexualidade. Esta dimensão sublinha a importância de considerar os aspectos simbólicos e psicológicos na compreensão da impotência sexual masculina do ponto de vista lacaniano.
Função sexual masculina normal requer…
Uma libido preservada
A capacidade de atingir e manter a ereção do pênis
Ejaculação
Detumescência
As principais estruturas anatômicas do pênis estão envolvidas na função erétil são os corpos cavernosos e o corpo esponjoso, situados à volta da uretra. Uma cápsula conjuntival, a túnica albugínea, envolve cada um destes corpos. A estrutura microscópica é uma massa de músculo liso que contém uma rede de vasos revestidos por endotélio. A tumescência peniana resultante em ereção se deve ao aumento do fluxo sanguíneo na rede lacunar após o relaxamento total das artérias e do músculo liso dos corpos cavernosos, à compressão subsequente do músculo liso trabecular contra a túnica albugínea fibroblástica, resultando no encerramento passivo das veias emissárias e na acumulação de sangue nos corpos. Se a ereção for completa e o mecanismo valvular estiver funcionando corretamente, os corpos se tornam cilindros não compressíveis, dos quais não sai sangue, então, eis a ereção.
O sistema nervoso central exerce uma influência importante, estimulando ou antagonizando as vias medulares que medeiam a função erétil e a ejaculação.
Um olhar sobre a Teoria das Relações de Objeto.
A impotência relacionada com conflitos inconscientes em torno dos objetos de desejo e da intimidade vai até à dificuldade em manter uma ereção, o que pode refletir ambivalência em relação ao ''objeto'' de desejo e fundar preocupações inconscientes sobre a intimidade. Klein deu importantes alicerces para a compreensão da mente e da sexualidade. O seu trabalho esclareceu como os indivíduos interiorizam isso, e como sensibilizam, movem e influenciam a vida emocional e sexual, onde esses instrumentos de desejo se interligam a psicologia. Essa abordagem que se centra nas relações interpessoais e na forma como interiorizamos e geramos representação mental dos laços. Desde o nascimento, os homens temos uma relação profunda com objetos externos, inicialmente com nossa mãe, que desempenha um papel vital na elaboração dos afetos e a sexualidade. Eles equivalem e constituem pessoas ou partes delas, significativos na vida de cada um. Inicialmente, o principal elo de desejo é a nossa mãe, que ocupa uma estrutura na formação da psique do bebê. Ele interioriza a mãe como uma concepção mental (objeto interno) e forma uma relação ambivalente com ela. Por exemplo, um bebê pode desejar intensamente ela, mas também pode sentir raiva ou ciúmes. Estes sentimentos paradoxais, são interiorizados e cruzam posteriormente nas relações interpessoais ao longo da vida. A relação ambígua e dúbia com tais objetos de desejo, que começa com a mãe, tem implicações profundas para a construção da proximidade nas relações adultas. Os indivíduos podem transportar esta hesitação para suas relações, que se manifestam como medos da interação com a estreiteza, pavor da rejeição ou dificuldade em confiar nos outros.
Vamos a uma sessão de análise que trata do problema;
Daniel: Boa tarde, Mario como vai? Por favor, se sinta à vontade para se acomodar. Gostaria de te lembrar que nossa conversa é confidencial, e estamos aqui para trabalhar juntos em busca de uma compreensão dos seus desafios. Posso pedir que você compartilhe um pouco mais sobre o assunto da semana passada?
Mario: Estou bem, obrigado Daniel. Essas dificuldades de lidar com a impotência sexual dos últimos anos tem afetado muito minha autoestima e principalmente meu relacionamento. Estou casado há cinco anos, e amo minha mulher, mas sinto que não estou conseguindo satisfazê-la sexualmente.
Daniel: Sim, entendo, é você sabe o que não está fazendo sexualmente para fazer tal dedução?
Mario: Não, é uma percepção… ao mesmo tempo que o problema de fato inclui insuficiência física. Ela tenta disfarçar.
Daniel: Para que eu possa compreender melhor a situação, fala um pouco mais sobre a história do seu relacionamento com ela, e quais são os momentos em que essa insuficiência se tornou mais evidente?
Mario: Tudo começou na faculdade, tivemos um namoro incrível, casamos e corria tudo bem, há cerca de dois anos, comecei a ter problemas em manter a ereção durante o ato. Isso me deixa ansioso, e isso só piora as coisas. Ela é compreensiva, mas, como se repete com frequência, sinto que estou decepcionando.
Daniel: Seria possível você identificar alguma mudança significativa em sua vida ou situação pessoal que coincidiu com o início desses problemas, é das decepções?
Mario: Não consigo pensar em nada em particular. Minha vida tem sido estável, e não houve nenhum evento traumático que eu possa relacionar diretamente a isso. Mas eu me preocupo muito com o trabalho e o dinheiro, então, talvez isso possa estar jogando um papel.
Daniel: A ansiedade em relação a essas áreas pode se manifestar dessa forma, no entanto, também pode ser útil explorar mais seu passado e a sua história pessoal para identificar eventuais influências inconscientes.
Mario: Sim, faz sentido, sempre fui autoexigente e tive uma educação religiosa rígida. Pode ser que isso contribua?
Daniel: A educação religiosa rigorosa e padrões altos de exigência, podem, de fato, influenciar a maneira como você se relaciona com sua sexualidade. Como pensa que sua educação e valores morais moldaram sua visão sobre a intimidade?
Mario: Cresci em um ambiente onde o sexo era muito tabu, tudo muito puritano, posso ter internalizado essas crenças.
Daniel: Você se sente confortável em continuar adentrando nesse processo?
Mario: Sim, estou disposto a falar tudo, sinto que minha vida está em jogo aqui, não apenas meu relacionamento.
Daniel: Sua disposição é um passo importante.
Mario: Estou sempre tenso, o que inclui coisas fora do quarto.
Daniel: Me conta as coisas que estão além do dormitório?
Mario: Quero mencionar algo que acho estranho. Houve uma vez, no passado, tive um caso extraconjugal, foi um resquício de uma relação que tinha antes de me casar… o que quero dizer, na verdade… e que não tive problemas de ereção naquela situação. Isso me confunde ainda mais.
Daniel: Quero saber detalhes sobre esse episódio específico? Como você se sentiu naquele momento em relação à pessoa com quem teve o caso?
Mario: Me senti mais relaxado, foi como se não houvesse pressão, e isso fez com que as coisas fluíssem naturalmente.
Daniel: Isso nos sugere haver aspectos emocionais e psicológicos envolvidos. Me conta mais… como foi a transa?
Discursa sobre por 8 minutos. Ok. Quero que você retome a fala da relação de vocês… Na sua opinião… esquecemos por um momento a questão fisiológica. Qual seria o desejo da sua esposa na sua opinião?
Mario: Tenho algumas teorias… porque ela não fala.
Daniel: Qual seriam suas suposições… fantasias, desejos?
Mario: Discorre por alguns minutos…
Daniel: Seu desejo de reconectar com sua esposa é compreensível, e um objetivo valioso para nosso trabalho junto. Além disso, você mencionou anteriormente que teve uma educação religiosa rigorosa e que a preservação dela no seio da família era valorizada. Como essas crenças e valores podem ter influenciado sua compreensão da sexualidade na infância?
Mario: Minha infância foi bastante conservadora, frequentávamos regularmente a igreja. Me lembro que qualquer menção a sexo era evitada em casa, e as crenças enfatizavam cumprir mandamentos, coisas do tipo.
Daniel: Você sentiu que essa educação religiosa rígida criou alguma ansiedade ou culpa em relação ao sexo durante sua infância, ou adolescência?
Mario: Sim, definitivamente. Na adolescência, tive sentimentos de angústia e culpa intensos quando comecei a sentir atração por mulheres… parecia que eu estava cometendo um pecado quando olhava para a bunda ou seios.
Daniel: Qual a sua opinião atual sobre isso?
Mario: Estou começando a ver como esses fatores podem estar ligados… pode ser que essa base, a pressão para seguir uma perfeição comportamental e a ansiedade tenham se combinado para criar essa situação.
Outras perguntas desenvolvidas durante a análise…(não incluirei as respostas)…
Daniel: Como você descreveria hoje a dinâmica emocional entre você e sua esposa fora do quarto? Existem momentos específicos em que você percebeu uma mudança que possa estar implicada aos seus desafios na vida sexual?
Daniel: Durante seus episódios de impotência sexual, como você lida com a comunicação com sua esposa? Vocês já tiveram conversas abertas sobre esses problemas?
Daniel: Além do caso extraconjugal que mencionou, você consegue identificar outras circunstâncias em que sua impotência sexual não foi um problema? O que havia de único nessas situações que você acredita possa ter contribuído para sua capacidade de relaxar?
Daniel: Como percebe a presença ou ausência de fantasias sexuais em sua vida? Se sente à vontade Mario para compartilhar essas excitações com sua esposa?
Daniel: Existem coisas específicas que te provocam ou que gostaria de comentar sobre sexualidade?
Daniel: Como sua esposa lida com isso? Já discutiram as necessidades emocionais dela em relação à intimidade?
Daniel: Considerou a possibilidade de incluir ela na terapia? Para abordar essas questões de privacidade, lubricidades e comunicação em conjunto?
A sessão de hoje chegou ao fim meu caro, nos encontraremos na próxima semana.
A articulação da sexualidade.
A compreensão da sexualidade é profundamente multifacetada, ambas escolas das quais me identifico academicamente, tanto freudiana quanto lacaniana, nos oferecem uma dimensão complexa da relação entre o sexo, o desejo, a castração e as diferenças de gênero. Freud enfatiza que a compreensão da sexualidade exige a inscrição do sexo no Complexo de Édipo, que desempenha um papel relevante na formação da psique infantil. O sujeito homem faz o seu próprio percurso de ruptura, permeado de tentativas falhas de continuar emocionalmente preso aos braços da mãe, mas deve recomeçar esta história de amor encontrando outro. Esta função de corte original, nos permite fugir do arcabouço ilusório de sermos o objeto de desejo da nossa mãe. Aqui, o falo assume a posição de uma premissa universal para o órgão sexual masculino, mas também, se torna um símbolo mais amplo de autoridade e desejo. Como Freud observa em “Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade” (1905), “O falo se torna o representante do desejo materno e a criança passa a se ver como da posse deste objeto” (Freud, 1905). Lacan avança a compreensão da sexualidade ao introduzir o conceito de função fálica. Ele argumenta que a dinâmica da diferença sexual é inaugurada quando a atribuição imaginária do falo cessa, e tanto homens quanto mulheres são constituídos como sexuados na dialética fálica. Essa ideia, ele apresenta em “O Seminário, Livro 20: Mais, Ainda” (1972), observando que “o falo é fundamental como significante, e esse significante está no imaginário da mãe, a qual é a base do ego infantil” (Lacan, 1972). A castração, como chave para a angústia, ressalta que seja ela o preço a que devemos pagar pela necessária estrutura simbólica. A castração é uma ameaça que paira sobre a psique, gerando ansiedade e angústia. Em “O Seminário, Livro 11: Os Quatro Conceitos Fundamentais da Psicanálise” (1964), Lacan enfatiza que “a castração é o que torna a nossa sexualidade abstrusa e intrincada por ser o elemento que introduz a falta no campo do desejo” (Lacan, 1964). Nas relações de gênero, como consignado por ambos, influenciam essa experiência sexual, trazendo a tona a inveja do pênis, mencionada por Freud em “Introdução às Teorias Sexuais Infantis” (1908), é vista como uma fonte de frigidez feminina, enquanto a ameaça de castração está relacionada com a impotência masculina, sem deixar de reconhecer às diferenças sexuais e suas implicações nas rotas eróticas e românticas de cada. Logo deduzimos que o encontro sexual envolve uma busca labiríntica, hermética e enigmática pela satisfação do desejo, mesmo quando esse comprazimento é ilusório.
Finalizando, o desejo por sua vez é uma força motriz, mas também uma fonte de ansiedade que envolve a angústia. “O sujeito, na presença do seu desejo, o antecipa como satisfeito, mas teme a satisfação, e se torna dependente do outro” (Lacan, 1957 – 1958). Por isso, é bem verdade que nenhum homem se separa definitivamente de uma mulher, enquanto uma mulher o faz a qualquer momento dele. Ele, figurativamente, nunca irá se separar da sua mãe, mas uma mulher, ao desunir de um homem retorna à sua mãe, e é por isso que para ela é tão singular e simples equacionar o problema. Em tal condição, se apresenta ao homem uma escolha inevitável, aquela que estará sempre como uma ponte entre o seu objeto incestuoso ou a de viver o sexo maduro, eis, portanto, uma renúncia difícil, pois um, tem de abdicar do outro. A figura valorosa do pai simbólico e capital nesta leitura, diria substancial, para este desmame, através do qual como crianças devemos nos distanciar do poder hipnótico que exerce a efígie materna. Essa identificação com o pai, com o ''ideal do pai'' é a solução que nos e ofertada como homens para lidar com essa extensão, medida e espaço do nosso narcisismo primário. O gozo do homem e da mulher não se entrelaçam, se há algo que possa ser convocado, é o ideal do gozo do ''Outro''. Esse provável lugar, onde o fracasso do desejo masculino, onde a mulher é conduzida a postular a ideia de possuir o órgão dele. Ato, que não exige potência, senão que se espalhe, exatamente, porque é lá, onde se aguarda pela falha, enquanto o outro dará o que não tem, e esta, será, a própria definição do amor. O gozo da mulher está nela própria e não se junta ao ''Outro''. Se existe uma afirmação conclusiva, posso dizer… a mulher encontra no homem a sua ausência primordial e mestra do verdadeiro falo, por consequência, seu desejo alcança a impossível satisfação. Nada pode emparelhar, chegar mais próximo do perfeito gozo do que o orgasmo masculino, nesse instante de implícita comunhão apenas o falo pode ser realizado e satisfeito, pois um homem só goza... se ela realmente o almejar, cobiçar e desejar.
Ao poema; A metafísica masculina.
Lúcia Scarlati
A ladainha é antiga
Antes do homem ser,
já tem de ser Homem.
Engole o choro!
Você é macho ou o quê?
Foi assim com o meu pai,
e com o pai dele,
e com o pai do pai dele,
e, antes dele, houve outro pai
com quem também foi assim.
Nessa História,
é mais Homem quem mais forte é.
Cabra macho ou herói,
Guerreiro ou lutador,
Patrão.
De toda forma,
Senhor.
Soberano.
A dúvida espreita –
Sou ou não sou?
Será que sou?
- mas logo silencia.
Homem não duvida.
Homem sabe.
Homem é.
E, por isso, Homem manda.
Homem é autoridade, é disciplina, é Lei.
E, por isso, Homem é obedecido,
Nunca contradito.
Homem é ser pronto e inteiro.
Ou o homem teria que assumir que não é Homem,
que era um pouco menos,
ou nem tanto assim.
O Homem nada se torna.
Não se transforma,
Não cresce e nem floresce.
Alheio ao tempo,
o homem se perde em seus labirintos.
Desorienta-se
sem nunca conhecer seus caminhos.
Enfim, acossado
por suas próprias dissonâncias.
Quer tanto ser…
Que busca, ainda hoje,
reencontrar
o ser prometido
em guerras infindas e sem sentido.
Quis tanto…
Mas, calado, guarda o gosto acre do tempo desperdiçado.
Até breve, Dan Mena. Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 - CNP 1199 Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 - CBP 2022130
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