Complexo de Electra.
- Dan Mena Psicanálise
- 16 de jul. de 2023
- 10 min de leitura
Atualizado: 22 de set. de 2024
“O complexo de Electra pode influenciar como mulheres se relacionam com outras, planteiam rivalidades e procuram afirmar sua superioridade. Isso pode levar a terem relações complicadas com os homens, lutando com sua própria autoestima e lidando com dificuldades em aceitar os limites da realidade”. Jung.
Por Dan Mena.

No final do século XIX, Freud lançou as bases da psicanálise e revolucionou a psicologia ao introduzir o estudo do inconsciente. Dois dos seus conceitos fundamentais, a interpretação dos sonhos e o Complexo de Édipo, derivam da mitologia grega, este caso especificamente da fábula de Édipo, tal como apresentado na peça de Sófocles, “Édipo Rei”. Assim, Freud utilizou o mito de Édipo como metáfora para compreender os complexos processos psicológicos da dinâmica familiar que influenciam o desenvolvimento humano. O “Complexo de Édipo”, (que será abordado em outro artigo), se refere à fase do desenvolvimento psicossexual em que crianças sentem atração pelo progenitor do sexo oposto e rivalizam com o progenitor do mesmo sexo. Ao relacionar estes conceitos com a peça de Sófocles, Freud pôde então explorar temas universais como o desejo, conflito, trauma, sexualidade e as relações de família numa perspectiva psicanalítica global. A ideia de “complexo” foi assim imediatamente retomada pela psicanálise, que seria mais tarde produto do pensamento de Carl Jung, (aluno de Freud), que, a partir da descrição do complexo de Édipo, construiu o que para ele era o que acontecia com mulheres. A esta abordagem lhe deu o nome de “Complexo de Electra”. Recorre assim a outra história, a helênica; Electra (em grego antigo; Ἠλέκτρα Êléktra).
“O complexo de Electra é uma fase importante no desenvolvimento psicossexual das meninas, onde se estabelecem laços e conflitos com a figura materna.”. Jung.
No âmbito da literatura, cada personagem ganha vida enquanto encarna um ideal. Como tal, não só é construída com base na desejabilidade social, como também cumpre a função de ditar às diretrizes, segundo os quais os sujeitos que convoca devem ser abordados. O teatro grego não é exceção a esta premissa, e Electra é um exemplo disso. Não é por acaso que a história dela foi retomada por tantos autores historicamente. A mitologia grega tem um número infindável de mitos e lendas que ainda hoje permanecem na cultura popular e fazem parte das nossas vidas. Tanto Sófocles como Eurípides escreveram sobre Electra nas suas tragédias, ela era filha do Rei Agamémnon e da Rainha Clitemnestra. O Rei partira para participar na Guerra de Troia, mas antes de seguir sacrificou a sua filha Ifigénia em homenagem a Ártemis, para lhe dar sorte na sua aventura de conquista. Este foi um dos principais fatores que abriram a fúria da sua mulher contra ele. Quando Agamémnon regressou da batalha, voltou com Cassandra, a sua nova concubina. Cassandra era uma mulher com poderes proféticos, mas cujas revelações nunca foram levadas a sério, mesmo que algumas acabassem por se revelar verdadeiras. Ela viu que a sua vida e a de Agamémnon terminariam quando voltasse para a família dele, mas isso não impediu do que viria a acontecer. No seu regresso, ambos foram mortos por Clitemnestra e Egisto, o amante da Rainha. Entre estes mitos tão aclamados, psicanalistas, cientistas e psicólogos, encontraram uma forma de explicar o complexo comportamento humano e de poder ensinar ludicamente através da história, uma teoria ou um fato científico que nos ensinam mais sobre nós próprios, a humanidade. O complexo de ''Édipo e Electra'' derivam da sua história homônima grega, para explicar a relação entre as crianças e os seus pais numa fase precoce do desenvolvimento. Boa leitura.
O termo cunhado pelo psicanalista Carl Jung em homenagem a Electra, personagem da mitologia grega que matou a mãe para evitar a morte do pai. Freud descreve o complexo como o desejo de uma filha pelo pai, pelo qual ela entra em competição com sua mãe. Segundo ele, a excitação inconsciente da filha de substituir a mãe como parceira sexual do pai, que está na base desta rivalidade. O conceito de “Complexo de Édipo” na sua teoria psicanalítica começa durante a fase fálica do desenvolvimento psicossexual, em que crianças experimentam desejos inconscientes de estar sexualmente com o progenitor do sexo oposto, no caso do complexo de Édipo, (o menino) em relação à mãe. Freud acreditava que estes interesses, desejos e conflitos edipianos eram uma parte natural do desenvolvimento psicossexual e a devida resolução adequada, parte crucial para um progresso psicológico saudável.
''O termo complexo é de origem junguiana, entendido como um conjunto de círculos de pensamentos e interesses dotados de poder afetivo''. (Alizade).
A peça Hamlet, de Shakespeare é analisada sob várias perspectivas, alguns críticos encontraram paralelos com o Complexo de Édipo na relação de Hamlet com a sua mãe, a rainha Gertrudes. Hamlet vive uma profunda angústia e uma lide emocional quando descobre que sua mãe casou rapidamente com o seu tio após a morte do seu pai. Este conflito se manifesta nos seus pensamentos e ações ao longo da peça. Esta teoria, é muitas vezes erradamente atribuída a Freud, porque foi de fato ele que inventou o Complexo de Édipo, e muitas pessoas acreditam que tanto Édipo quanto Electra são opostos do mesmo tema. Mas, na verdade, Freud não aprovava que assim fossem vistos, defendia que ambos fenômenos tinham motivações e desenvolvimentos diferentes, onde uma comparação era absolutamente descabida. Foi Freud quem primeiro estudou esta relação e lhe deu o nome de “Édipo Feminino”. Ele explicou, que o desenvolvimento psicossexual das pessoas se processa em cinco fases: oral, anal, fálica, latente e genital. É durante a fase fálica que ocorre o Complexo de Electra, entre os 3 e os 6 anos. Neste período, em que as crianças de ambos os sexos estão obcecadas com seus genitais, é quando as meninas descobrem que não têm pênis, assumem assim que suas mães são responsáveis por essa falsa e suposta deficiência constitutiva. Esta inautêntica “castração” imaginada pela menina é conhecida na psicologia freudiana como “inveja do pênis”. Apenas como uma fase passageira, após qual a criança volta a se ordenar emocionalmente com a mãe para a ter e usar como modelo. O desejo de possuir um pênis, que, segundo Freud, as mulheres tanto anseiam, é compensado adiante e posteriormente ao amadurecimento pela gravidez. Fora do complexo de Electra, foi demonstrado clinicamente que mulheres que tiveram ou têm uma boa relação com seu pai, canalizam sua personalidade, ou mesmo, rastreiam por características físicas congêneres, proporcionais e compatíveis para o que seria ''supostamente'' o seu homem ''ideal''. Estes postulados não se referem apenas ao complexo de Electra, pois se trata de uma noção que provém da psicologia em geral, comprovada por estudos científicos que denotam este portento que afeta efetivamente homens e mulheres.
Sobre o Complexo de Electra em psicanálise.
Freud sublinhou o termo “Complexo de Édipo”, inspirado na personagem clássica para descrever relações amorosas que se estabelecem entre a criança e a sua mãe, e suas consequentes rivalidades, hostilidades e identificações. Dito fenômeno leva a criança a se identificar como pessoa sexualizada, a descobrir o seu próprio sexo e corpo e o dos seus pais, e por fim, procurar um objeto no qual depositar o seu afeto e amor. Neste contexto se funda uma tríade, onde a criança (menino), sente uma paixão pela mãe e hostilidade e ciúme pelo pai. Édipo simboliza o ser em busca da verdade a todo o custo, seguida de uma purificação expiatória. Ao expiar então sua tragédia, ele assume a dimensão ética e moral da situação. Da trama psicanalítica do Complexo de Édipo, emerge o conceito de transgressão, proibição e culpa como elementos estruturantes do ser. A manifestação deste hermético nas meninas é um pouco mais complicado do que no caso dos meninos. Ela dirige os seus primeiros sentimentos de culpa, personificação e amor à mãe, mas, à medida que cresce, reconhece a sua falta do falo, (pênis) assim, deve transferi-lo para o pai, (que possui tal), e identifica-se com a mãe, que lhe fornece o exemplo da mulher que será quando amadurecer e crescer. Esta posição é extremamente difícil para a menina, que se envolve numa relação altamente ambivalente com a mãe, uma vez que, por um lado, tem de assumir a mãe como um objeto desvalorizado para realizar essa troca pelo pai, e, por outro, tem de se identificar com esse mesmo objeto. “É aqui que reside o principal conflito. Um sentimento de paixão pelo pai e fortes tendências para manifestar hostilidade e ciúme em relação à mãe estão então presentes” (Jung). Assim, Freud dirá que; existe o ''Complexo de Édipo'' tanto no homem como na mulher e a diferenciação de gênero se estabelecerá não por uma mudança no nome do complexo, ''Édipo-Electra'', mas pela falta de paralelismo nos processos, dado o game psíquico diferente em que cada sexo entra em relação ao medo da fantasia de castração.
Lacan faz sua contribuição com as seguintes conclusões;
1 - Num processo de aquisição de identidade, tanto o rapaz como a menina olham para si próprios no "espelho simbólico" (estádio do espelho é o instante mental onde a criança capta a percepção sobre sua unidade corpórea. Por meio de uma identificação com a imagem refletida no espelho e de outra pessoa, entende que ela também é unidade. Assim, cria mecanismos para compreender e avaliar que também possui imagem e identidade) proporcionado pela mãe, devido ao importante vínculo que com ela mantêm durante os primeiros anos de vida.
2 - Posteriormente, uma terceira dimensão intervém entre a relação mãe-filha, que é determinada pela figura paterna real e pelo ambiente sócio-cultural em que vivem. Forma-se então um laço profundo e um maior processo de socialização na menina.
3 - O desejo da criança pelo pai desaparece, substituindo assim o ''Eu Ideal'', (o eu ideal é uma instância imaginária, a imagem no espelho, uma projeção. Para que essa imagem se constitua, no entanto, é necessário que o olho, no esquema óptico, esteja em certa posição em relação ao espelho, ou seja, que o sujeito se situe em uma posição no simbólico) ligado a fantasias irreais, pelo ''Ideal do Eu'' (o ideal do eu pressupõe perfeição, valoração ao que caracteriza alguém como um ser ilibado, irreparável, sempre de natureza modelar. É, segundo Freud (1914), resultado do narcisismo dos pais. Antagônico ao ''eu ideal'', tem-se o ''ideal do eu'', influenciado por valores culturais, morais e críticos), que integra o princípio da realidade e a aceitação dos seus limites. A menina percebe que só poderá concretizar suas expectativas sentimentais quando se tornar adulta com outra figura masculina.
Lacan desenvolveu a sua própria interpretação do complexo de Electra, que difere em certos aspectos das teorias de Freud e de outros psicanalistas, espelhando a sua abordagem sempre particular;
“O complexo de Electra está enraizado na falta simbólica, no desejo de completude e na procura de reconhecimento e de amor em relação ao pai e a outros significantes no campo da linguagem.” Lacan.
“O complexo de Electra envolve uma série de identificações e desidentificações ao longo do desenvolvimento da criança, moldando a sua subjetividade e a sua posição na ordem simbólica.” Lacan.
Os sintomas do Complexo de Electra podem variar de menina para menina;
Atração sexual pelo pai.
Rivalidade com a mãe.
Medo de perder o pai.
Sentimentos de culpa e vergonha.
Baixa autoestima.
Problemas de relacionamento.
Algumas dicas que podem ajudar com o embrulho;
Oferecer muito amor e apoio.
Incentivo a expressão dos sentimentos de forma saudável.
Auxílio para desenvolver uma relação positiva com a mãe.
Ensinar e falar sobre sexo e relacionamentos.
Mostrar com palavras e atos um amor incondicional.
Consequências para a vida adulta.
A experiência de transitar por esse evento pode ter um impacto significativo no desenvolvimento da personalidade de uma mulher, influenciado pela natureza da sua relação com a figura materna. Às experiências com os pais têm repercussões na percepção da realidade e na formação de laços afetivos em outras áreas da vida. Na idade adulta, a mulher pode projetar inconscientemente nas suas relações interpessoais e amorosas certos conflitos vividos na infância, como a rivalidade e a competição com outras mulheres, ou o desejo constante de mostrar superioridade sobre elas. Além disso, suas relações com homens podem tornar-se complicadas, ao sofrer com efeitos de baixa autoestima e dificuldade em aceitar os limites da realidade, o que pode originar um isolamento. Se o complexo evoluir bem, o lado feminino se define claramente e se aceita a realidade, tomando consciência de que terá de encontrar outro amor. Caso contrário, pode surgir uma anomalia patológica que exige uma terapia e um tratamento psicoterapêutico que lhe permita aceitar a sua atração e atravessar dita distorção. É muito importante que a mulher consiga uma aceitação interior da sua feminilidade, para que sua imagem de mulher encontre o seu espaço real. Quando o desenvolvimento ocorre de forma saudável, aceitar a realidade é compreender que terá de procurar um amor diferente daquele do pai. É fundamental essa aceitação interna da identidade, desenvolvendo uma imagem de si própria autêntica, que não seja descontextualizada, e lhe permita encontrar o seu lugar no ''outro''. Através da terapia e do tratamento psicoterapêutico, o objetivo é auxiliar a mulher a explorar e a compreender suas emoções, desejos e conflitos subjacentes, promovendo uma maior consciência dos laços.
Críticas ao Complexo de Electra.
Criticado por alguns psicólogos, que argumentam que dita caracterização tem um tom sexista e que subestima a capacidade das mulheres para desenvolverem uma identidade feminina saudável, sem terem de competir com a mãe pelo amor do pai. Outros, apenas contrapõem que se trata de uma tese desatualizada, que não se aplica à sociedade moderna. Prosseguem aduzindo, que mulheres contemporâneas têm mais liberdade e oportunidades do que as do passado e que já não precisam de passar pelo Complexo de Electra para desenvolver uma identidade. Ouvidas às críticas que merecem seu lugar, (já que ouvimos todos), o Complexo de Electra continua para nos psicanalistas a ser um conceito importante na psicanálise e no trabalho clínico, contribuindo e ajudando a explicar o desenvolvimento da mulher e a importância da linguagem no desenvolvimento psíquico.
Uma fase superada.
No desenvolvimento das crianças, é fundamental aplicar a paciência e o apoio para superar seus conflitos internos, o que lhes permite crescer e amadurecer na formação e elaboração da sua própria personalidade. É importante evitar exagerar sobre suas ações ou ironizar meninas por terem ciúmes da mãe, ou por competirem pelo afeto do pai. Não é salutar entrar em jogos de rivalidade, garantindo o entendimento que seu pai é seu pai, e a ama profundamente. Por volta dos 7 anos, essa fase de antagonismo tende a diminuir, e as meninas passam a tomar a mãe como seu modelo de referência, a seguindo e imitando quando ela for presente na sua formação. No complexo de Electra, podem surgir sintomas limitantes, como a incapacidade de se apaixonar e amar, ter dificuldades na prática e exercício de intimidades com outras pessoas. Podem também, procurar parceiros com traços de caráter semelhantes aos do seu pai, buscando inconscientemente por um par que seja próximo ao genitor nos relacionamentos adultos, mesmo que esses perfis não correspondam às suas necessidades e exigências emocionais. Embora esses comportamentos sejam considerados normais na infância, na idade adulta podem se tornar patologias que requerem atenção e ajuda de profissionais para poder superá-los e levar a uma vida harmônica. Cada indivíduo é único, e pode vivenciar essas dinâmicas de forma diferente, sendo fundamental buscar ajuda profissional para lidar com quaisquer dificuldades emocionais ou padrões comportamentais que afetem a sua qualidade de vida.
Ao poema.
Ser criança.
Tatiana Belinky
“Ser criança é dureza-
Todo mundo manda em mim-
Se pergunto o motivo,
Me respondem “porque sim”.
Isso é falta de respeito,
“Porque sim” não é resposta,
Atitude autoritária
Coisa que ninguém gosta!
Adulto deve explicar
Pra criança compreender
Esses “podes” e “não podes”,
Pra aceitar sem se ofender!
Criança exige carinho,
E sim! Consideração!
Criança é gente, é pessoa,
Não bicho de estimação!”
*Do livro “Problemas da literatura infantil”.
Até breve, Dan Mena. Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 - CNP 1199 Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 - CBP 2022130
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