A Realidade.
- Dan Mena Psicanálise
- 13 de mai. de 2023
- 13 min de leitura
Atualizado: 22 de set. de 2024
''Não avistamos as coisas como são, senão como somos; como indivíduos agimos e sofremos a ação, encontrando um limite para nossos desejos, onde usamos de meios para realizá-los, isso é realidade para o sujeito contemporâneo''. Dan Mena.
Por Dan Mena.

A realidade, em todos os seus aspectos, registros, formas e possibilidades, regem o princípio da existência humana. Não é surpreendente, portanto, que encontremos na busca da sua concepção diferenças de leitura tão distantes uma da outra, onde a subjetividade desempenha seu principal papel. Neste caso, a imaterialidade e a abstração tem um relevante papel nisso. E é, precisamente, porque neste aspecto temos uma realidade diferente dos outros, geralmente baseada em certos princípios simbólicos e particulares, que se constituem como o principal obstáculo à sua verdadeira compreensão.
As observações históricas feitas sobre o conceito de realidade provém da Grécia, com seus principais expoentes como Platão. Ele desenvolveu em suas escritas, diferenças básicas em termos de realidade real e humana. O ''mito da caverna'', é talvez a abordagem mais clara sobre o tema: (O Mito da Caverna resumido). Certa vez, uma das pessoas presas (escravos), que viviam numa caverna, um deles conseguiu se libertar das correntes e escapou para o mundo exterior. A princípio, a luz do sol, a natureza e sua diversidade de cores e formas, assustaram o agora ex-prisioneiro. Livre pelo mundo, se admira com as inúmeras novidades e descobertas que faz. Assim, tomado pela compaixão dos seus companheiros escravos, decide voltar para a caverna e compartilhar com os outros prisioneiros todas as informações sobre o esse mundo exterior que presenciou. As pessoas que estavam na caverna, porém, não acreditaram nas coisas que ele contava, e o chamaram de louco. Para evitar que suas ideias contaminassem e atraíssem outras pessoas para os “perigos da insanidade”, os cativos matam o fugitivo solidário. Para Platão, a caverna simbolizava o mundo onde todos os seres humanos vivem. As sombras projetadas pelas tochas em seu interior, representam a falsidade dos sentidos, enquanto as correntes dos escravos, os preconceitos que carregamos, que por sua vez, nos aprisionam sobre à escuridão da ignorância e o senso comum. Este conto, chama a atenção por se manter atual. A alegoria de Platão, pode ser interpretada como uma crítica, aos que por preguiça ou desinteresse não questionam a realidade, aceitam ideias impostas socialmente por um grupo qualquer, dominante sobre outros. O mundo das sombras e das aparências, é o resultado da projeção real das ideias, visto como o bem.
Segundo o filósofo, o ambiente em que vivemos, é esse lugar que impede o nosso acesso à luz. A sua teoria do conhecimento, parte da distinção entre a percepção sensível, que proporciona um conhecimento relativo da realidade, e o saber científico e racional, que se aprofunda no verdadeiro ser das coisas e das ideias. Estas, são entidades universais, essenciais e subjetivas, exteriores, imutáveis, um universo à parte das coisas, que não são mais do que cópias escuras. Graças às ideias que atuam como princípios ontológicos, podemos tomar consciência sobre elas. Dita concepção, pensou o conhecimento das coisas como um processo de síntese, em que o indivíduo, contemplando a realidade através dos seus sentidos, sabe, ou pensa que sabe, o que elas são. A antropologia platônica, descreve o homem como um ser constituído por dois elementos, alma e corpo, cuja união é puramente acidental. A alma é anterior ao corpo, e sobrevive à sua união. Posteriormente, Rene Descartes repensou os postulados de Platão, partindo do que chamou de “dúvida metódica”, que suspende o julgamento diante de tudo o que não se apresenta ao espírito com a clareza e a distinção para ser considerado evidente, procura assim, o caminho de uma verdade. Questiona as aparências sensíveis, e mesmo às verdades matemáticas. No entanto, consegue encontrar veridicidade na própria dúvida, uma vez que não pode duvidar sobre o que está mesmo questionando, em outras palavras, pensar… onde entra o aforismo “penso, logo existo”. O reconhecimento da verdade, da intuição sensorial, o conduz a estabelecer, juntamente com a substância pensante em que ocorre a intuição, a existência da substância extensa. Com a afirmação desta última, funda o dualismo cartesiano, colocando o problema da existência real na “substância extensa”.
Assim, num breve histórico chegamos a época moderna, Freud retoma esses postulados, e formula uma nova teoria da existência, sob um novo princípio e olhar, onde seguindo parâmetros científicos, propõe uma visão diferente sobre o assunto.
Até aonde seria possível afirmar uma realidade autêntica, original, legítima e pura?
A visão psicanalítica
Existem realmente fundamentos suficientemente firmes, nos quais poderíamos edificar as bases da realidade, e de todos os nossos hipotéticos conhecimentos?
Se nossos pressupostos saberes, que sempre serão reestruturados por outros que virão, não passam, portanto, de água que escorre pelas mãos, esses mesmos, que mal resistem ao tempo, com às vagas idealizações do ceticismo e do próprio relativismo humano. Assim realidade, está mais para o imaginário, quanto para um ato concreto da existência. A sua perspectiva tem uma posição curiosa na psicanálise, ao encampar, tanto o terreno no qual o sujeito age e sofre a ação, quanto o de encontrar um limiar para seus desejos indispensáveis e onipotentes, usando os meios necessários para, justamente, realizá-los. Isto é, torná-los contextos da realidade. O panorama psíquico é uma construção capaz de abrigar o desejo, na mesma medida em que o toma como causa das suas associações e representações passíveis de consumação, e toda dita atividade, absolutamente mediada pela fantasia. Juntamente se conecta com o princípio da realidade, base do rumo dos acontecimentos mentais e suas formas de funcionamento. O princípio do prazer, que a acompanha, caracteriza-se pela procura de satisfação, quanto coadjuvante ao mesmo tempo, da evitação da dor, sofrimento, estresse, angústia e tensão, por parte do sujeito. Se por um lado, o princípio de realidade busca a satisfação no dito (real), por outro, o princípio do prazer continua regendo a nossa instância inconsciente, a qual funciona conforme as leis dos processos primários, e apresenta outra realidade, isto é, as fantasias. A realidade psíquica nasce com a psicanálise, que, através das suas investigações, toma consciência e constata a necessidade de dar importância ao nosso mundo mental, criando assim uma caracterização de cenário panorâmico para a conjuntura psíquica da veridicidade.
Realidade primordial
''A realidade primária da vida é a sensação, mas, como somos conscientes, a nossa atitude superior é de criaturas conscienciosas dos efeitos e impressões que coletamos. Isto é, se transladam diretamente em favor das nossas ideias, pela via dos sentimentos, comoções, emoções, vivências e experiências''. Dan Mena.
Qual a estrutura que nos coloca em contato com a realidade?
Freud construiu a estrutura do aparelho psíquico; suas bases nos colocam em diálogo com a realidade, com o mundo externo, sendo elas: o superego, pré-consciente, recalque, ego e id.
A prova da existência, é um conceito freudiano, que se pode traduzir como a possibilidade de um indivíduo distinguir estímulos provenientes do mundo exterior e impulsos do mundo interno, sem produzir confusão ou gerar conflitos, entre aquilo que percepcionamos e o que circunstância (seu entorno), dita, realidade. Esse contexto, é o conjunto dos corpos físicos existentes, suas manifestações e formas de relação em torno dos acontecimentos, cuja percepção recai sobre a subjetividade do conhecimento de cada pessoa, (sua experiência e interpretação), capazes de elaborar e construir. Se desenvolve assim como o Ego, a partir do amadurecimento da personalidade e da vida social. Portanto, os aspectos culturais vão falar alto sobre esse conteúdo que preencherá o Ego, ainda que sua função seja fixada. Assim, podemos afirmar que o Ego se guia pelo princípio da realidade, regulando os impulsos inadequados do Id. Essa instância psíquica, também age como mediadora entre as vontades do Id e as limitações do superego. Ou seja, o Ego nos ajuda a manter o equilíbrio e a sanidade da nossa personalidade.
Definimos para compreender melhor;
O Ego faz parte da tríade do modelo psíquico, formado pelo Ego, Superego e pelo Id. O Ego é considerado o defensor da personalidade, logo responsável por impedir que os conteúdos inconscientes passem para o campo da consciência, acionando assim os gatilhos dos seus mecanismos de defesa.
Id é responsável pelos instintos, impulsos orgânicos e desejos inconscientes. O id não tem contato com a realidade, pode se satisfazer na fantasia, mesmo que não realize uma ação concreta referente aquele desejo específico.
Superego é o aspecto moral da nossa individualidade, responsável por domar o Id, ou seja, sua função é reprimir os instintos primitivos originais do indivíduo, com base nos valores morais e culturais da época.
''A realidade externa, constitui a antíteses da realidade psicológica''. Freud.
Quais são as 4 ideias de Freud?
Os principais conceitos que inauguram a psicanálise de Freud são: a noção de inconsciente; a teoria sexual e o princípio do prazer e desprazer; a teoria das pulsões e a noção de aparelho psíquico.
O que é a realidade para Lacan?
O real, o imaginário e o simbólico, é um conceito misterioso e enigmático, difícil de definir na teoria lacaniana, uma vez que para o fazer são necessários os outros dois registros, por ser aquilo que não é imaginário e não pode ser simbolizado. Real, é tudo o que tenha presença e existência própria, e, ao mesmo tempo, não é representável. Ele demonstrou como a realidade de cada um se constrói como um lego, uma montagem simbólica e imaginária, tendo o fantasma como enquadramento. Em suma, não é com a realidade que está em causa uma verdadeira franqueza do pensamento. Freud a sinaliza em “para além do prazer” e Lacan, diferenciou a “realidade” do “real”. O simbólico implica uma profunda reflexão crítica, de um ponto de vista filosófico e sociológico, de todos os elementos que compõem a nossa realidade, bem como do poder que dita e delimita nossa vida, concretude e liberdade.
Definições;
O Simbólico é uma dimensão que nos marca, nos nomeia e reconhece na condição de sujeitos falantes, que por sua via nos leva a verificar algo de importância clínica: antes de falarmos, de termos capacidade de manejo linguístico com seus efeitos de sentido, somos falados.
O termo Imaginário, designaria o campo da relação dual com a imagem do ''Outro''. Deste modo, seria um conceito mais amplo que o estádio do espelho, (O estádio do Espelho é um momento particular da vida psíquica da criança, processo de maturação, no qual ela vive uma experiência de identificação fundamental e faz a conquista da imagem de seu próprio corpo), uma vez que diz respeito às consequências do fato, de que o ''eu'' é fundado numa relação de pressupostos e conjeturas.
O que é a realidade externa?
A realidade psíquica é regida pelo princípio do prazer e a veracidade externa, que pode ser definida como uma condição de visão compartilhada, a mesma ganha traços para o que é desagradável, insuportável, e pode gradualmente, ser tolerado pelo nosso psiquismo. Tenho que acrescentar o princípio da constância, que se refere a uma expressão que surge na segunda teoria das pulsões de Freud. A mesma, designa a tendência do aparelho psíquico em manter uma quantidade de excitação num nível baixo ou pelo menos, a mais equilibrada e constante possível.
Realidade científica, pela visão psicológica.
Concepção científica da realidade se baseia precisamente nas hipóteses modernas do pensamento filosófico clássico, segundo as quais, a percepção da realidade externa é fragmentada, devido às limitações dos sentidos, em segundo lugar, pelas deficiências dos mesmos, visto não ser possível captarmos os objetos na sua essência.
Darei um exemplo dessa deformação;
Fiquei sentado confortavelmente na lateral de uma estrada, suponha que tenho um amigo, que conta com um veículo que pode ser impulsionado a altas velocidades (N) e topa, realizar a experiência que proponho. Pedi que passasse a minha frente pela primeira vez dirigindo o carro a 100 km por hora, e solicitei, que a cada nova passagem do automóvel no ponto que me encontrava, dobrasse a velocidade. Na primeira passada que foi há 100 km por hora, minha percepção era absolutamente clara quanto ao conjunto velocidade/veiculo/contexto. Na medida que tais passagens se alteraram para 300 km, 600 km, etc., o meu senso de realidade e percepção, tanto do veículo, cor, ruídos, todo o conjunto sensorial foi se alterando, esmorecendo, perdendo-se, ao ponto de que num determinado momento do aumento da aceleração, não percebo mais tal objeto passando a minha frente, e ao final, literalmente desaparece. Posso dar centenas de modelos para essa experiência, mais este, me parece muito lúdico e facilmente compreensível.
Então, qual séria a essência dos objetos?
O conhecimento científico se fundamenta no suporte do dito quantificável, e desta forma o seu método evolui para implantar sua metodologia. Para a ciência, a realidade das coisas é apenas aquela que permite a observação mediante um sistema de registros observáveis, tal se adapta às leis que a própria ciência propõe. No entanto, o objetivo do pensamento científico é avançar para além do tangível, da experiência sensível. Segundo Descartes, como demonstram as teorizações da matemática, da física e da astronomia, há uma vontade de pensar o universo a partir do abstrato, para que o sistema de registro seja útil, enquanto nos permite conceitualizar um dado fenômeno por meio da sua descrição. Esta forma de “conhecer” a realidade, baseia-se particularmente no método científico. A este respeito, Bunge e Ardila, formulam alguns princípios filosóficos da investigação científica, a qual são a base anatômica do conceito de realidade.
Princípios ontológicos (metafísicos);
— O mundo existe por si.
— É composto exclusivamente por coisas, objetos concretos.
— As formas são propriedades das coisas, não são ideias coexistentes.
— Nada surge do nada, e nada se reduz ao nada.
— Existem diferentes níveis de organização: físico, químico, biológico, social e tecnológico.
— Todos os sistemas, com exceção do universo, têm origem no agrupamento e formação de sistemas, que por sua vez, são subsistemas de outros sistemas.
Princípios sobre o conhecimento humano;
— Podemos conhecer o mundo, a realidade, embora de forma parcial, imperfeita, deformada e gradual.
— Cada ato de conhecimento, é um processo inserido no sistema nervoso de um ser.
— O ser humano, só pode conhecer dois tipos de objetos; os materiais e os conceituais, proposições e teorias.
— Só é possível conhecer uma coisa, se ela, é a outra, puderem ser ligadas, conectadas por sinais que o primeiro deve detectar e decodificar.
— Existem diferentes modos de conhecimento: pela percepção, pela concepção e pela ação; e eles são combinados de diferentes maneiras em muitas investigações.
Como se pode observar, há uma evidente semelhança entre o modelo psicanalítico e o científico do materialismo, sendo o protótipo científico da materialidade emergente, enquanto ambos, admitem a preexistência das coisas numa realidade, digamos, física, em que uma série de objetos ou coisas se agrupam, formandos níveis de organização, complexamente articulados, que formariam uma realidade simbólica, a partir da articulação dessa existência física. Atualmente, e sobretudo no campo da comunicação e da psicologia, existe uma controvérsia entre a tese de que há um maior ou menor realismo nos sistemas de representação, e a ideia de que isso é o resultado de uma interpretação sem importância, porque a relação de uma imagem ilusória com a realidade é sempre, em qualquer caso, resultado de uma operação de codificação e descodificação por parte do observador. Na primeira tese, se defende que uma vez que não existe um olho inocente, tudo o que o visionamos não passa da própria invenção imaginária. A segunda proposta, mais discreta, insiste que não podemos nos considerar construtores do nosso peculiar e intrínseco mundo, enquanto representar, é apenas ilustrar a si. Por essa leitura, seríamos conduzidos à impossibilidade de propor um realismo, mesmo para falar de um surrealismo menor ou maior, conforme diz; (Maldonado,1994). Essa crítica ao modelo científico, de que toda realidade não passa de uma construção falsa dos sentidos, leva à impossibilidade de se propor um realismo dos sentidos, que traz implícito um problema básico: pensar que tudo é subjetivo.
“A percepção visual não funciona com a fidelidade mecânica de uma máquina fotográfica, que registra tudo imparcialmente: todo o conglomerado de pequenos pedaços de forma e de cor que constituem os olhos, a boca da pessoa que possa para uma fotografia. Ver, significa apreender alguns traços salientes dos objetos: o azul do céu, a sombra das montanhas, a corcova do camelo, a retangularidade do livro, o brilho de uma peça de metal, a retidão do cigarro” (Arnheim, 1995).
Para ir fechando, podemos afirmar que, da enorme quantidade de informações e dados produzidos pela experiência sensorial; luz, sombras, escuridão, calor, som, impressões táteis, etc., retiramos apenas a informação que pode ser agrupada na consciência para gerar uma representação mental. A percepção, segundo a Gestalt, não está sujeita à informação proveniente dos órgãos sensoriais, mas regula nossa sensorialidade. O fato de recebermos indiscriminadamente dados permanentemente da realidade, implicaria em nossa perplexidade constante, onde teríamos que permitir ser dominados pelo seu imenso volume de estímulos, oferecidos pelo meio ambiente. A Gestalt definiu num primeiro momento, a percepção como uma tendência à ordem mental, lugar onde a sensibilidade determina a entrada de informação; numa segunda fase, assegura, que ditos recolhimentos do meio, permitem formar abstrações, juízos, julgamentos, categorizações, formação de conceitos, etc. Assim, o que move profundamente o nosso ser é o real, (com todas suas impossíveis interpretações, hehehe), aquilo ao que poderíamos chamar do sentido forte da nossa vida. Invocar o real então, seria o nosso ponto de vista particular?. Desde que ditas concepções acrescentassem de alguma forma um forte impacto na nossa vida?. A realidade é, deste o ponto de vista não teórico, o mesmo que intensidade, potência ou força? Que ao contrário da transitoriedade e instabilidade não dizem respeito a ela. Para Platão, o espírito matemático e a realidade estão nas ideias, porque tais vivem nelas. No polo oposto, a realidade coincide com os afetos, sensações e sentimentos, como o suposto concreto. Às ideias, podem ser sentidas tão intensamente quanto sensações, pois no fim das contas, estes dois termos tão opostos e equidistantes, estão unificados ao se chocarem.
Diz o provérbio popular que as ''aparências enganam''. Defraudam, precisa e rigorosamente, diante do nosso descontentamento com o que enxergamos como verdade. Possuímos o desejo natural do saber e do desvelo, logo quando algo se apresenta para nós pela via dos sentidos, pretendemos logo saber. Como funciona? Qual sua origem? Qual sua composição? Isso é determinante da espécie, desde que somos ''Homo sapiens''. Nosso diletantismo se amplia e expande, inclusive, para outros limites além do atualmente possível de ser verificado. Estamos sempre sob a ótica interpretativa de impor uma ordem cronológica por trás do que desponta. Será que o que visualizamos descende de uma mera fantasia ilusionista? Que tudo ao que damos crédito acoberta uma segunda realidade e verdade dissimulada?, como afirma a física quântica. Por quê?… Na antiguidade, nossos ancestrais seguiram por uma resposta sempre transcendental, metafísica, conectada a religiosidade. Qual o princípio de tudo? O que seria o tudo?. Com a ampliação do conhecimento contemporâneo em várias direções, e desde o surgimento dos primeiros filósofos, iniciamos o pensamento da própria razão existencialista, questionamos, se tal razão humana de ser, não poderia ir além da resposta à grande questão. Existe o princípio de tudo?. É o que subsiste no universo observável, é verdadeiramente concreto?. O que de fato não conseguimos compreender da criação e da criatura? Por que existe algo ao invés do nada? Creio que esse questionamento final, seja um argumento muito razoável neste ponto evolutivo para a existência de Deus.
Será que o criador nos legou sabiamente a busca da “explicação”, precisamente para procurarmos por ele?.
Ao poema com Alberto Caeiro;
A Realidade.
A espantosa realidade das coisas
É a minha descoberta de todos os dias.
Cada coisa é o que é,
E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra,
E quanto isso me basta.
Basta existir para se ser completo.
Tenho escrito bastantes poemas.
Hei-de escrever muitos mais, naturalmente.
Cada poema meu diz isto,
E todos os meus poemas são diferentes,
Porque cada coisa que há é uma maneira de dizer isto.
Às vezes ponho-me a olhar para uma pedra.
Não me ponho a pensar se ela sente.
Não me perco a chamar-lhe minha irmã.
Mas gosto dela por ela ser uma pedra,
Gosto dela porque ela não sente nada,
Gosto dela porque ela não tem parentesco nenhum comigo.
Outras vezes oiço passar o vento,
E acho que só para ouvir passar o vento vale a pena ter nascido.
Eu não sei o que é que os outros pensarão lendo isto;
Mas acho que isto deve estar bem porque o penso sem esforço,
Nem ideia de outras pessoas a ouvir-me pensar;
Porque o penso sem pensamentos,
Porque o digo como as minhas palavras o dizem.
Uma vez chamaram-me poeta materialista,
E eu admirei-me, porque não julgava
Que se me pudesse chamar qualquer coisa.
Eu nem sequer sou poeta: vejo.
Se o que escrevo tem valor, não sou eu que o tenho:
O valor está ali, nos meus versos.
Tudo isso é absolutamente independente da minha vontade.
Por Dan Mena, até a próxima. Membro Supervisor do Conselho Nacional de Psicanálise desde 2018 - CNP 1199 Membro do Conselho Brasileiro de Psicanálise desde 2020 - CBP 2022130
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